14 de abr. de 2015

IV Mostra Pajé de Filmes Indígenas

A Mostra Pajé de Filmes Indígenas chega à sua quarta edição. Pela primeira vez abrimos inscrição para seleção de filmes. Recebemos produções oriundas de vários estados do Brasil e de outros países, como Argentina, Chile, Venezuela, México e Canadá.
Dos filmes inscritos, selecionamos 19. Outros 5 filmes, brasileiros e estrangeiros, participam da Mostra como convidados: Hotxuá (2009), de Gringo Cardia e Letícia Sabatella; Rituais e Festas Bororo (1916), de Luiz Thomaz Reis; Segredos da Tribo (2010), de José Padilha; Smoke Signals (1998), de Chris Eyre; e The Exiles (1961), de Kent MacKenzie. Para os dois últimos a Pajé Filmes promoveu a tradução e legendagem para o português.
Curtas, médias e longas metragens compõem nossa programação, ao longo de cinco dias no mês de abril de 2015.
Maya Deren, artista experimental norte-americana, foi uma das que perceberam a relação entre os fazedores de filmes e os xamãs ou pajés. Ela considerava os espectadores de cinema como participantes de uma espécie de ritual. O filme teria para ela a capacidade de nos mergulhar num mundo diferente, como se estivéssemos em transe. Nutrimos simpatia por essa concepção e, de certa maneira, acreditamos que exibir e discutir os filmes indígenas em ambiente urbano é proporcionar contato com universo simbólico distinto e o trânsito para o mundo diferente dos índios, estejam eles vivendo em florestas, desertos ou cidades.
Aby Warburg, estudioso alemão que conjugou seu profundo conhecimento sobre as artes com a expressão dos índios pueblos do sudoeste dos Estados Unidos, também viu nos rituais uma gênese artística que inclui a do movimento cinematográfico. Como escreve Philippe-Alain Michaud, em Aby Warburg e a Imagem em Movimento, “Warburg descobriu nas aldeias indígenas um tipo de pensamento que provinha estritamente das imagens e agia através das imagens.” E mais: “à semelhança de Eisenstein interpretando os hieróglifos japoneses, Warburg havia descoberto entre os hopis uma concepção da montagem capaz de transformar as imagens, por meio da dança ou do desenho, em ação.”
Em Minas Gerais os Maxakali realizam como que projeções cantadas das imagens que ilustram suas histórias. Através do canto, os participantes do ritual imaginam cenas, personagens, falas e ações que compõem seus mitos. Algo como um cinema oral ou cantado. Como escreve Arlindo Machado em Pré-cinemas e Pós-cinemas, “pode haver uma representação mais eloquente do movimento, da duração, do trabalho modelar do tempo e do sincronismo audiovisual nas formas pré e pós-cinematográficas do que nos exemplos ‘oficiais’ da performance cinematográfica.”
É ainda Michaud quem arremata, levando-nos a ver com clareza certas implicações entre o ritual indígena e o ritual cinematográfico: “No cinema, a ação ritual transforma-se em tema figurativo, e a faca sacrificial é substituída pela tesoura do montador. A decomposição e a recomposição das figuras, permitidas pelo cinema, nada mais são do que a roupagem profana de uma concepção mitológica da imagem, que dá forma à explicação do tempo, abrindo as categorias do ser para o abalo do devir.”
Esta IV Mostra Pajé de Filmes Indígenas é consequência do prazeroso trabalho que vem sendo desenvolvido pela Pajé Filmes desde 2008, seja na produção e divulgação de filmes com temática indígena, seja também na pesquisa.
Convidamos a todos para o ritual!